“Quem não pode com mandinga, não carrega patuá”, diz uma antiga expressão, hoje muito usada como sinônimo de outra coisa que diz: “quem não tem competência, não se estabelece”.
Comete engano quem acre di ta que a expressão esteja referin do a mandinga como feitiço, ebó, ‘coisa feita’, etc. Mandinga é um grupo (ou na ção) africano do norte que por sua proximidade com os árabes aca bou por se tornar muçulmano e, sendo esta uma religião fanati zante, seus adeptos têm verdadei ro ódio aos que não aceitam Alá como Deus ou Maomé como seu profeta.Com o desenvolvimento do trá fico de escravos, muitos negros mandingas vieram parar nas Amé ricas, vítimas que foram da ambição dos brancos. Por serem os negros mandingas muçulma nos, muitos desses escravos sa biam ler e escrever em árabe, além de conhecer a matemática melhor do que os brancos, seus senhores, e este estado superior de cultura de um determinado grupo negro fêz com que fossem tidos como feiticeiros, passando a ex pres são mandinga a sinônimo de feitiço. Por outro lado, os negros que praticavam o culto aos Orixás eram vistos como infiéis pelos ne gros mulçumanos. O branco, aproveitando-se dessa rivalidade e confiando aos mandingas fun ções superiores que os demais, fazia a animosidade entre eles crescer. Os mandingas não eram obrigados pelos brancos a ingerir restos de carne de porco, e até mesmo permitiam que estes trou xes sem trechos do Alcorão en cerrados em pequenos invólu cros de pele pendurados ao pescoço. Geralmente eram os mandingas quem acabava ocupando o lugar de caçadores de escravos fujões, os chamados “capitães-do-mato”. Por isso, quando um negro pre tendia fugir, além de se prepa rar para lutar sem armas através da capoeira e do maculelê, ele dei xava o cabelo carapinha e pen durava ao pescoço um patuá, de forma que pensassem tratar-se de um mandinga, para não ser per se guido. Todavia, se um verda deiro mandinga o abordasse e ele não soubesse responder em ára be, o verdadeiro mandinga des car re garia todo seu furor nesse in fe liz negro fujão.Daí nasceu a expressão “quem não pode com mandinga, não carrega patuá”.
A vingança a quem se atre vesse a portar um falso objeto considerado sagrado pelo muçul mano era qualquer coisa de ter rível. Mais tarde, porém, o hábito de utilizar patuás entre negros foi se generalizando, pois estes acre ditavam que o poder dos man dingas era devido, em grande par te, aos poderes do patuá. Por outro lado, os padres também uti li zavam, e ainda hoje utilizam, cru cifixos e medalhas, Agnus Dei, etc., que, depois de benzidos, a maio ria das pessoas acredita pos sam trazer proteção aos devo tos nelas representados.Nos primeiros terreiros de Can domblé que se organizavam, era comum o pedido de patuá por parte dos simpatizantes e até mes mo por aqueles que temiam o culto afro, pois dizia-se que o patuá poderia até mesmo neutra lizar trabalhos de magia negra. MAS, AFINAL, O QUE É PATUÁ? O patuá é um objeto consa grado que traz em si o aché, a força mágica do Orixá, do santo ca tólico ou Guia de luz, a quem ele é con sagrado.
Entre os ca tólicos já era há bito usar um frag mento de qual quer objeto que houvesse perten cido a um santo ou a um papa, até mesmo fragmento de ossos de um mártir ou lascas de uma su posta cruz que teria sido a de Cristo. Até mesmo terra, que era trazida pelos cruzados que volta vam da Terra Santa e que a utiliza vam nesses relicários, considera dos poderosos amuletos, que de ve riam atrair bons fluidos e prote ger dos azares.
O nome relicário é originário de latim relicare-religar, que aca bou formando a palavra relíquia.
Logo o clero percebeu que não po deria impedir o uso dos patuás pelos negros, que os tiravam an tes de entrar na igreja, mas vol tavam a usá-los ao afastar-se de la. Decidiram, então, substituir o patuá africano (o autêntico), que tra zia trechos do Alcorão, por outro que trazia orações católicas, me da lhas sagradas, Agnus Dei (uma espécie de medalha com o forma to de coração, que se abre ao meio, onde se encontram as figu ras de Jesus e Maria ou ainda sím bolos da Igreja tradicional).
Com a formação dos primei ros templos de Umbanda e a possibilidade de um contato mais estreito com diversas Entidades es pi rituais, as pessoas que busca vam proteção começaram a en con trar nesses objetos sagrados um apoio (era algo material que continha a força mágica vibratória da entidade que o trabalhara e que o crente poderia ter sempre con sigo). A partir daí, as entidades de luz passaram a orientar sua ela boração, indicando quais objetos seriam incluídos na confecção do patuá e como se deveria proceder com eles para que recebessem o seu aché, isto é, a força mágica. Os ingredientes geralmente mais utilizados para a confecção dos patuás são os seguintes: Figas de guiné; Cavalos ma rinhos; Olhos de lobo (raros e ca ros); Estrela de Salomão; Estrela da guia; Cruz de caravaca; Couro de lobo; Pêlo de lobo; Santo Anto nio de guiné; Imagens de Exu e Pom ba Gira da Guiné; Pontos di versos; Orações; Sementes varia das; Imãs, etc. Não nos esqueçamos que es sas coisas singelas não têm ne nhum valor se não forem pre paradas pelas entidades incorpo rantes. Somente estas podem dar o aché ao patuá.
Trechos do livro “Iniciação à Umbanda” vol. 2 – Tríade Editora de Pai Ronaldo de Linares e Diamantino Fernandes Trindade.